Criação de novo arcabouço fiscal pode trazer retorno rápido e positivo no mercado

Credibilidade na execução fiscal é fundamental para que o arcabouço gere efeitos positivos na economia

Por Rafaela Vitoria*

Desde a aprovação da PEC da Transição, que abriu espaço para novo crescimento das despesas acima do teto e delimitou prazo para a elaboração de novas regras fiscais, a ausência de uma âncora trouxe maior insegurança entre os agentes econômicos, e o resultado tem se refletido na elevação dos prêmios de juros no mercado, bem como em expectativas de inflação em alta.

– Por que a questão fiscal é tão relevante no debate econômico no Brasil

Temos um longo histórico de expansão de gastos públicos, que foram majoritariamente financiados com elevação de carga tributária e aumento da dívida. Entre 2003 e 2016, os gastos do governo cresceram a uma taxa média anual de 6% acima da inflação. Na maior parte do período, a arrecadação acompanhou esse crescimento, e o governo manteve superávit fiscal em média de 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB).

Porém, com as limitações atreladas ao crescimento da carga tributária no Brasil — que hoje, em 34% do PIB, é uma das maiores entre países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) —, o governo passou a apresentar déficits primários a partir de 2014, e a crise fiscal levou à recessão, o que impactou ainda mais as fontes de receita.

Em 2016, as despesas saíram do patamar de 15% para 20% do PIB. Com a necessidade de reestruturar o arcabouço fiscal, que tinha como âncora a meta de superávit — facilmente alterada a partir da deterioração em 2012 —, o teto de gastos, a partir de 2016, exigiu significativos esforços no controle das despesas, o que resultou em um patamar de gastos em queda pela primeira vez desde o Plano Real.

A melhora fiscal nos últimos dois anos, tanto pela arrecadação como pelo controle de gastos, foi evidente com a redução rápida e inédita para 73,5%. No entanto, a dívida pública se mantém em elevado patamar.

Novamente, o teto de gastos se mostrou eficiente no controle do crescimento das despesas. Mas não sem fazer ruído, o que acabou tirando a credibilidade da capacidade de melhora fiscal estrutural no Brasil. As constantes PECs para flexibilizar aumento de gastos minaram a confiança de investidores. Mesmo a melhora apresentada não resultou em queda dos prêmios de risco nos juros, que ainda refletem a desconfiança acerca da trajetória futura.

– Como deve ser

O novo arcabouço fiscal deve ter como principal objetivo estabilizar a trajetória da dívida pública, que hoje, projetamos, subirá de 73% para 76% em 2023. Para que isso aconteça, o governo precisará voltar a apresentar superávit fiscal estrutural ou indicar qual será o caminho.

Ao longo dos anos, várias lições foram aprendidas para a construção do novo arcabouço: a regra fiscal não pode ser tão rígida que seja difícil de ser cumprida, como o teto de gastos, nem tão vaga que seja fácil mudá-la, como a meta de resultado primário.

O controle de gastos ainda é fundamental como uma das âncoras, principalmente considerando nosso histórico e as inúmeras demandas da sociedade. O crescimento desenfreado das despesas públicas está entre as principais causas dos resultados negativos e da desestabilização.

Monitorar a evolução das contas públicas e identificar distorções que precisam de reformas estruturantes ao longo do tempo é fundamental.

A constante avaliação das políticas públicas é outro ponto importante para melhorar a qualidade e a eficiência dos gastos, permitindo que políticas possam ser revistas e aprimoradas ou eventualmente abandonadas em caso de não alcance dos objetivos.

Considerando as atuais restrições orçamentárias e a necessidade de investimento no Brasil, continuar evoluindo nos marcos regulatórios setoriais vem se mostrando outra peça fundamental para o crescimento do investimento privado, que pode contribuir para o maior PIB potencial do Brasil.

Por fim, a reforma tributária também pode trazer um grande avanço pelo lado da arrecadação, trazendo maior previsibilidade, reduzindo os custos jurídicos para todo o sistema, eliminando os gastos em benefícios fiscais e melhorando a produtividade da economia.

*PhD, CFA charterholder e economista-chefe e head de Research do Banco Inter

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