A sub-representação das mulheres na política brasileira

Por Gabriela Shizue Soares de Araujo*

Se a população global está quase igualmente dividida entre homens e mulheres, por que a média mundial da participação feminina em parlamentos é de 26,4%? O dado é da Inter-Parliamentary Union (IPU), uma organização global dos parlamentos nacionais que conta com a adesão de 178 países. Já a resposta para a pergunta, você pode imaginar.

Por muito tempo convenientemente considerado o “sexo frágil”, o sexo biológico das mulheres as condenou apenas à esfera doméstica de cuidados do lar e dos vulneráveis. Impedidas até mesmo de acessar uma educação formal ou o mercado de trabalho, a maioria das mulheres do Ocidente somente conquistou seus direitos políticos nas primeiras décadas do século XX, ainda que não totalmente em pé de igualdade com os homens naquele momento.

No Brasil, o direito feminino de votar e ser
votada foi conquistado em 1932, com o
Código Eleitoral de Getúlio Vargas.
Enquanto o voto masculino era
obrigatório, o feminino era facultativo.

Após a constatação dos efeitos deletérios à democracia causados por essa imposição jurídico-legal de exclusão da participação feminina nas esferas públicas de poder e de debate, a Organização das Nações Unidas (ONU) e demais organismos internacionais que se dedicam à proteção dos direitos humanos passaram a defender as cotas de gênero e políticas afirmativas como mecanismos necessários.

Desde 1997, a Legislação brasileira exige que os partidos políticos apresentem chapas de candidaturas ao Legislativo com pelo menos 30% de mulheres candidatas. Ao longo das décadas, também foram implementadas outras políticas afirmativas adicionais – todas insuficientes para combater de forma efetiva a discriminação estrutural contra as mulheres na sociedade e nas instituições.

  • Basta verificar o resultado das eleições de 2022:

Somente 91 mulheres foram
eleitas deputadas federais, o que
corresponde a 17,7% da totalidade
das 513 cadeiras disponíveis.

O número representa um avanço irrisório se comparado ao resultado das eleições de 2018, quando 77 mulheres foram eleitas deputadas federais e ocuparam 15% das cadeiras.

Nas Assembleias Legislativas dos Estados, os dados são parecidos: na somatória de deputadas estaduais e distritais, chega-se ao total de 190 mulheres eleitas (18%). Especificamente em Santa Catarina, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Goiás, a representatividade feminina ficou abaixo de 10%.

Com relação ao Senado, teria acontecido um retrocesso relevante caso suplentes não tivessem assumido. Considerando apenas o resultado das últimas eleições, das 81 cadeiras disponíveis, apenas dez seriam ocupadas por mulheres senadoras a partir de 2023 – duas a menos que na legislatura anterior. No entanto, haverá o ingresso de cinco mulheres suplentes: uma porque o titular foi eleito governador do Estado, e outras quatro porque os titulares se tornaram ministros do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

– Resistência dos partidos políticos em investir nas candidaturas de mulheres;
– Fraudes reiteradas às parcas cotas de gênero existentes em nossa legislação;
– Violência e assédio político direcionado às mulheres que ousam se candidatar

São alguns dos fatores que contribuem para que o Brasil esteja puxando para baixo a média das Américas de participação feminina nos parlamentos.



As dificuldades que as mulheres brasileiras enfrentam para alcançar postos de liderança são ainda mais evidentes quando a lupa é colocada sobre o Executivo. Das 27 unidades federativas do País, apenas dois Estados são governados por mulheres agora. Temos Fátima Bezerra (PT) no Rio Grande do Norte e Raquel Lyra (PSDB) em Pernambuco. Além disso, somente 12% dos municípios brasileiros são comandados por mulheres prefeitas, sendo Cinthia Ribeiro (PSDB), prefeita de Palmas, no Tocantins, a única a dirigir uma capital.

É necessário redesenhar o arcabouço jurídico-legislativo e as políticas afirmativas existentes no Brasil, para que possamos romper definitivamente essas barreiras estruturais e avançar rumo à democracia paritária. Mas é preciso vontade política para fazer acontecer. Com um Congresso formado por mais de 80% de homens, se não houver muita cobrança da opinião pública, o Brasil continuará passando vergonha em relação a seus pares.

*Conselheira da Esfera Brasil, é advogada com atuação em Direito Público, doutora e professora de Direito Constitucional na Faculdade de Direito da PUC-SP.

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