Antes de 2062

De carros voadores a realidade aumentada e robôs colaborativos, máquinas que antes só apareciam na ficção científica já são realidade no Brasil

Por Carlos Tautz

Quem assistiu, na TV dos anos 1960, à futurista animação Os Jetsons — em que uma família comum usava carros voadores e robôs domésticos — imaginou que chegaríamos ao século 21 desfrutando do cotidiano mecanizado mostrado na série. De fato, no fim do primeiro quarto do novo centenário, estão disponíveis os meios de transportes aéreos e a internet das coisas que os Jetsons da ficção usavam há 60 anos, quando apresentavam o cotidiano de uma família de classe média vivendo no utópico e, então, distante ano de 2062.

Aquele futuro já chegou — e empresas brasileiras fazem parte dele. Por exemplo, em meados de outubro, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) liberou R$ 500 milhões para a instalação, na cidade de Taubaté, interior de São Paulo, de uma fábrica de eVTOL, o carro voador da Eve, uma subsidiária da fabricante nacional de jatos Embraer. Segundo a empresa, a produção anual de eVTOLs — que realizarão a fantasia dos Jetsons — será de 480 aeronaves. Cerca de 30 potenciais compradores de 13 países teriam manifestado intenção de adquirir até 2.900 unidades, que poderão render US$ 14,5 bilhões em vendas.

“Ela [a unidade de produção em Taubaté] será alimentada por energia limpa e renovável, alinhada ao nosso compromisso com a sustentabilidade”, conta Johann Bordais, diretor-executivo da Eve. Dias antes, a empresa divulgara, em Orlando, nos Estados Unidos, o conceito de um avião pilotado por inteligência artificial (IA), sem comandantes humanos.

Carros voadores são exemplos recentes de tecnologias disruptivas e caracterizam-se por romper paradigmas. Seu uso se aprofundou tremendamente desde a segunda metade do século 20, quando foram inventadas e difundidas mundialmente a informática e a internet.

A disponibilidade desses intrigantes gadgets chega em grande velocidade.

Óculos virtuais para educomunicação

Uma das mais visíveis e impressionantes tecnologias é a realidade estendida (XR, na sigla em inglês, que reúne as realidades virtual, aumentada e mista), utilizada em óculos especiais para cinemas 3D, no comércio e em projetos educacionais, quando reproduzem situações e até pessoas que já existiram ou talvez nunca venham a existir.

Uma das referências nessa área é a empresa Beenoculus, que fabrica na sua sede, em Curitiba, no Paraná, equipamentos XR voltados para a educomunicação. A especialização em produção de óculos de visão virtual para a área de ensino gerou até uma subsidiária, a Beetools, dedicada ao aprendizado automatizado especificamente de línguas.

Chips verde-amarelos

Outra tecnologia disruptiva brasileira é uma incógnita promissora. Trata-se dos produtos da estatal Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada (Ceitec), de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, que fabrica semicondutores — também conhecidos por chips ou circuitos integrados (CIs). Única na América Latina a fabricar chips — peças nanoscópicas que estão em todos os produtos ou processos de fabricação —, a Ceitec já esteve para ser privatizada, foi resgatada no governo de Luiz Inácio Lula da Silva e, agora, se encontra em uma encruzilhada técnico-comercial.

Em tese, ela poderia chegar a fabricar até circuitos integrados para computadores pessoais e videogames, além de sistemas de defesa, automóveis, aeronaves — incluindo os carros voadores — e automóveis, em que cada vez mais há centenas e até milhares de chips embarcados em cada unidade. 

Embora demande investimentos altos, com ciclos de pesquisa, maturação, produção e venda de até 15 anos para amadurecer, a empresa já pode atuar em nichos promissores, como identificação por radiofrequência, comunicação sem fio, segurança, criptografia e o vasto campo das identificações (animal, patrimonial, pessoal, logística e veicular). 

Robôs colaborativos

“O futuro da interação humano-robô não é futuro, é presente”, vaticinou, no Jornal da USP, o professor Arturo Forner-Cordero, do Departamento de Engenharia Mecatrônica e Sistemas Mecânicos da Escola Politécnica. “No passado, achávamos que os computadores iriam substituir os trabalhadores, mas criaram novos caminhos. Os robôs para interação física não tiram o trabalho das pessoas, mas podem abrir outras perspectivas.”

Ele se refere à uma concepção de robótica na qual máquinas substituiriam operários e gerariam demissões. Mas, hoje, seus defensores argumentam que os robôs operam processos industriais perigosos, que demandam esforço físico contínuo, repetitivo, e não apenas podem, como devem, por segurança e salubridade, estar na bancada ao lado de um operário. É praticamente impossível encontrar no Brasil uma fábrica de médio porte sem autômatos. 

De acordo com a Federação Internacional de Robótica (IFR, na sigla em inglês), em março deste ano, havia cerca de quatro milhões de robôs desse tipo operando no mundo inteiro. Só no País, são 20 mil máquinas. A ARV Systems, empresa brasileira com sede em Mogi das Cruzes, São Paulo, se destaca no setor, para o qual oferece soluções e serviços desde 2009.

Também chamadas de “cobots” — corruptela da expressão em inglês collaborative robot —, essas máquinas não param de assumir novas posições em indústrias de metal, usinagem, cosméticos, saúde, móveis, ciência, entre muitas outras.

Ainda faltam 38 anos para chegarmos à época em que viviam os Jetsons e, pelo andar da carruagem — ou dos carros voadores —, a nossa sociedade irá muito além do que fora antevisto pela ex-família do futuro.

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