
- Política
- jul | 2025
- Redação
Onde o destino do Congresso é traçado
O intuito do Colégio de Líderes é garantir a democracia e ir além dos interesses particulares das bancadas
No intrincado labirinto do Congresso Nacional, projetado por Oscar Niemeyer para ter uma arquitetura intencionalmente marcante e complexa, poucas instâncias têm tanto poder quanto o Colégio de Líderes. Constituído pelos líderes da maioria, da minoria, dos partidos, dos blocos parlamentares e do governo, esse colegiado não é apenas um órgão consultivo. Ele pulsa como o verdadeiro coração da Câmara dos Deputados. É ali, longe dos holofotes do plenário, que a agenda legislativa é moldada. As negociações de bastidores têm forte potencial para definir os rumos e a própria condução dos trabalhos da Casa, a ponto de decidir o que avança e o que fica na gaveta.
No Colégio, fórum de diálogo e negociação, os líderes partidários levam ao presidente da Câmara as demandas e prioridades de suas respectivas bancadas. É nesse espaço que se constrói a pauta de votações e que se decide quais projetos serão apreciados. “É uma forma de o presidente da Câmara, Hugo Motta, definir as prioridades do plenário”, explica o cientista político Cristiano Noronha, vice-presidente da Arko Advice, empresa de análise e inteligência política. “O Colégio ajuda a construir consensos e garante que a pauta reflita os interesses das diferentes forças políticas representadas na Casa.”
Obviamente que a entrada de um projeto em pauta não significa que já exista um acordo para se votar contra ou a favor. “O Colégio de Líderes tem seu poder, mas é uma instância de negociação política para decidir, ali, o que vai entrar na pauta. É uma definição sobre o que será votado, e não do mérito”, lembra Noronha. Depois, em votação, cada bloco parlamentar decidirá como orientar a sua bancada.
As reuniões do Colégio de Líderes são notórias por sua discrição, ocorrendo a portas fechadas, sem a presença da imprensa. No entanto, as decisões tomadas e os resultados das discussões são sempre divulgados publicamente. As reuniões ocorrem com regularidade, pelo menos uma vez por semana — geralmente às quintas-feiras —, mas podem ser convocadas com maior frequência, dependendo da necessidade e da urgência dos temas em debate.
O presidente da Câmara detém o poder de definir o que será votado, mas é praxe que ele ouça as lideranças para conhecer as prioridades de cada partido, além de sentir a temperatura das discussões. As decisões são tomadas por acordo de líderes e, em muitas ocasiões, os procedimentos de votação também são negociados. Por acordo de liderança, prazos podem ser suprimidos, e o rito processual de um projeto de lei pode ser modificado.
A importância do Colégio de Líderes reside em sua capacidade de garantir a governabilidade e a eficiência do processo legislativo. Ele permite que as diferentes bancadas expressem suas demandas e negociem soluções, evitando que a pauta seja definida de forma unilateral pelo presidente da Câmara. “Ele define aquilo que vai ser votado e, por acordo, pode estabelecer regras no processo de votação ou como uma proposta vai tramitar”, afirma o cientista político.
Vale ressaltar que o Colégio de Líderes não é exclusividade da Câmara dos Deputados. O Senado Federal também possui um colegiado similar, com uma dinâmica semelhante, reunindo os líderes partidários para definir a agenda de votações e negociar procedimentos. Ambos os colegiados desempenham um papel crucial na engrenagem do Poder Legislativo brasileiro.
Desafios da atual gestão
Na gestão de Motta, Cristiano Noronha observa um período com ritmo de votações e decisões legislativas relativamente mais lento se comparado a outros períodos. Ele atribui essa situação a diversos fatores, como o elevado número de feriados, as viagens do presidente da República e a complexa dinâmica de um governo que não possui uma maioria folgada no Congresso Nacional.
Apesar disso, o Colégio de Líderes continua sendo um espaço fundamental para a negociação política. Noronha destaca que, mesmo em tempos de polarização política, há temas que conseguem gerar consenso, como a reforma tributária e o arcabouço fiscal. No entanto, outros temas, como o Projeto de Lei da Anistia, encontram resistência e não são pautados por falta de acordo entre as lideranças.
A influência do governo sobre o Colégio de Líderes também tem limites. “Ela não é irrestrita. Se fosse assim, o governo só colocaria projetos [com] que estivesse de acordo, a exemplo da demarcação de terras indígenas, que ele não queria em votação. A bancada do agro, como é muito forte, se articulou e pautou. E o governo, inclusive, foi derrotado nessa votação e não teve como impedir. Se a influência do governo fosse majoritária, a gente nunca teria pautas contrárias a ele”, diz Noronha. Um dos maiores desafios do Colégio de Líderes, acredita, é definir uma pauta de votações que foque projetos que resolvam problemas estruturais do Brasil, como questões fiscais, infraestrutura e segurança pública. “O maior desafio é tentar viabilizar um conjunto de posições que resolvam problemas da economia e do País”, acrescenta. E questiona: “Será que o Colégio de Líderes não poderia fazer um levantamento de projetos que resolvam essa situação fiscal de uma forma mais estrutural?”.
As decisões tomadas pelo Colégio de Líderes invariavelmente refletem, em maior ou menor grau, os anseios da sociedade. No entanto, é inegável que os acordos internos entre os partidos e as pressões de diferentes grupos de interesse também exercem forte influência. Temas praticamente inadiáveis clamam por soluções que dependem, como ponto de partida, das decisões tomadas nesse colegiado tão fundamental para o funcionamento da democracia brasileira.