O home office perdeu espaço após o fim da pandemia, mas ainda é uma preferência entre profissionais do Brasil
Por Barbara Câmara
Em meados de 2020, escritórios improvisados em casa se tornaram lugar-comum para boa parte dos trabalhadores brasileiros. O home office veio para alguns como o único modelo de trabalho possível durante a pandemia, e, passados alguns anos desde o fim da crise sanitária, o formato permanece em muitos setores do mercado — mas por quanto tempo?
O retorno ao trabalho presencial, seja integralmente ou em uma mescla na rotina híbrida, é uma tendência definitiva. Um estudo realizado com 792 empresas — somando quase um milhão de colaboradores — e publicado em 2025 pela empresa de benefícios Swile, em parceria com a Leme Consultoria, confirma essa realidade: entre as pessoas ouvidas, quase 60% afirmaram que estão atuando em formato presencial.
“Essa tendência, na verdade, é global. Vemos muitas empresas internacionais trazendo seus colaboradores novamente aos escritórios, e o Brasil acompanha esse movimento”, explica Júlio Brito, general manager da Swile no Brasil. “Há vários pontos que levam a essa decisão, desde maior proximidade entre os times até valorização da cultura organizacional. A pesquisa mostra que o trabalho 100% presencial já superou os modelos híbridos e remotos, com 33% das empresas afirmando operar dessa forma. Portanto, acreditamos que, nos próximos anos, esse número deve aumentar”, detalha.
Entre os fatores que motivam esse cenário, o coordenador de Operações e Pessoas do Centro Universitário São Camilo em São Paulo, Thiago Simões, que também é professor dos cursos de Administração e Gestão de Pessoas, observa que gestores e CEOs de empresas alegam a existência de uma “queda de desempenho” em grande parte das equipes e, muitas vezes, de uma dificuldade na atuação, no convívio, na troca e no desenvolvimento de colaboradores a distância.
“O que a gente vê é que, no mercado nacional, existem ainda poucas ferramentas tanto de controle de produtividade quanto de conexão. A gente ainda tem um pouco de dificuldade no desenvolvimento e utilização dessas ferramentas para a interação entre os colaboradores e até os líderes”, pondera Simões.
Segundo o professor, o mercado nacional está trazendo o cenário híbrido — com uma majoritariedade de dias presenciais e apenas alguns com a flexibilidade do home office ou totalmente remotos. “Nós temos um impacto muito grande no transporte público ou particular que faz com que as pessoas queiram atuar no modelo home office. Mas vejo essa dificuldade de gestão que os CEOs e as direções têm com relação a como medir produtividade e convívio dos colaboradores”, avalia.
Contramão
Apesar do caminho que o mercado segue, as preferências de muitos colaboradores ouvidos durante a pesquisa vão na direção oposta: 21,1% dos participantes indicaram o home office como um dos benefícios mais desejados entre os que uma empresa pode oferecer — figurando acima de opções como seguro de vida e previdência privada.
Nesse contexto, Júlio Brito acredita ainda haver espaço para o trabalho remoto no País. “Observamos que algumas áreas, como a da tecnologia, ainda reservam muitas vagas remotas, não apenas considerando o home office, como também o anywhere office, para nômades digitais, por exemplo. Mas percebemos que a maior tendência são as companhias equilibrarem a flexibilidade de trabalhar em casa com a interação presencial”, pontua o especialista da Swile.
Thiago Simões reforça a necessidade de atenção ao lado humano do colaborador para, assim, flexibilizar de acordo com as necessidades particulares — como o dia do rodízio de veículos ou o dia de buscar os filhos na escola. “Isso faz com que ele [o colaborador] tenha um olhar muito diferenciado perante o contratante. Esse lado humanizado da gestão perante as necessidades do funcionário faz com que ele tenha uma autonomia, crie uma responsabilidade maior das suas entregas e estabeleça esse laço com a instituição. E ter esse momento presente na empresa favorece a conexão com os outros colaboradores”, argumenta o professor.
O que mudou desde a pandemia
Embora tenha saído fortalecido após o período da pandemia, o trabalho remoto perdeu espaço no mercado brasileiro nos últimos anos. O que pode explicar essa mudança?
Simões lembra que, inicialmente, foi observado um ganho de produtividade e de qualidade de vida. Contudo, a falta de interação e, por vezes, de entrosamento entre as equipes que surgem como consequência do home office fizeram com que as gestões revissem esse modelo de atuação para um modelo híbrido, com um mínimo de convívio no presencial, ou para um retorno integral ao escritório.
“Posso falar por experiência própria, porque hoje tenho equipes tanto no modelo presencial como no híbrido e no full home office. É muito relevante avaliar o ramo de atuação, o tipo de atribuição que o time ou o colaborador tem e o quanto que existe a necessidade de interação para uma boa entrega. Na pandemia, como já estávamos isolados em ‘ilhas’, enclausurados em casa, essa produtividade foi ascendente, mas, diluído na linha do tempo, ficou um pouco mais complicado, de acordo com o tipo de atuação que você tem”, descreve.
O professor do Centro Universitário São Camilo exemplifica da seguinte maneira: equipes de Tecnologia da Informação (TI) atuam com facilidade no modelo remoto, assim como alguns escritórios de arquitetura, uma vez que cada profissional cuida de um projeto distinto. Quando se trata de colaboradores cuja atuação é tanto individual quanto coletiva, porém, a falta de interação — com a cultura organizacional e entre os que fazem parte da mesma equipe — gera um impacto específico no desenvolvimento do profissional.
“Há colaboradores com muita produtividade atuando no home office, mas que hoje têm dificuldade de apresentar projetos e interagir com o restante da equipe. Então, criou-se essa ‘bolha’ em que o desenvolvimento técnico pode ter sido impactado positivamente, e o comportamental negativamente”, explica.
Modelo ideal
Para o futuro, a expectativa é de que a cultura organizacional continue sendo um pilar importante para as empresas brasileiras e dite a forma como os funcionários serão recebidos — ou não — no escritório, os benefícios e suas atividades.
“Ouvir os funcionários e criar um ambiente de pertencimento são ações essenciais”, avalia Brito. “Vemos também muito espaço para crescimento do uso da inteligência artificial em diferentes setores, uma vez que 48% dizem não usar essa ferramenta no seu dia a dia, algo que deve ser muito explorado nos próximos anos.”
Já em relação ao formato de trabalho ideal, o general manager aposta em um equilíbrio, com alguns setores ainda operando de forma totalmente remota, como o de tecnologia, por exemplo, enquanto outros investem em melhorias em seus escritórios ou benefícios para reter os talentos no formato presencial, agregando qualidade de vida e praticidade para todos.
Para Simões, o trabalho híbrido é o que mais se aproxima de um modelo ideal para o mercado. Voltar integralmente ao presencial seria, em suas palavras, um “total retrocesso”, considerando os ganhos do home office constatados no pós-pandemia, como o apoio ao funcionário e a redução de custo para as empresas.
“Quando é apresentada para a alta gestão a intenção de retornar para o presencial, os custos de preparo da unidade, os custos de consumíveis, de vale-transporte, tudo isso entra na balança. Então, claro, isso vai depender também da área de atuação do colaborador. Seria necessário fazer uma análise do que é benéfico para ambas as partes, bem como o tipo de entrega e o quanto essa distância impacta ou não a atividade e o desenvolvimento do colaborador”, detalha.